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Ao infinito e além: A primeira mulher a viajar ao espaço

Após a morte de Lenin, em 1924, um comitê de três membros (troika) foi designado para governar a União Soviética. No entanto, Josef Stalin, o então secretário-geral do Partido Comunista, conseguiu suprimir todos os grupos de oposição dentro do partido e consolidar o poder em suas mãos. Leon Trotsky, o principal defensor da revolução mundial, foi exilado da União Soviética em 1929 e a ideia de Stalin de "socialismo em um só país" tornou-se a linha principal.


A contínua luta interna no Partido Bolchevique culminou no Grande Expurgo, um período de repressão em massa entre 1937 e 1938, durante a qual centenas de milhares de pessoas foram executadas, incluindo os membros e líderes militares originais do partido, que foram acusados de golpe de Estado.


No dia 6 de março daquele ano de 1937, na vila de Maslennikovo, no distrito de Tutayevsky na Rússia central, nascia Valentina Tereshkova. Filha de um casal camponeses imigrados da Bielorrússia, não sabia as grandes coisas que a aguardavam no futuro e da sua importância para a história russa. O pai de Tereshkova era um motorista de trator e sua mãe trabalhava em uma fábrica de têxteis.


Valentina começou seus estudos aos oito anos, porém precisou deixar a escola aos dezesseis e continuou sua educação por meio de cursos por correspondência. Por volta de 1959, aos 22 anos Tereshkova trabalhava em uma indústria têxtil na vila de Maslennikono. Nessa mesma época ela encontrou um hobby que seria seu grande diferencial no futuro: paraquedismo.


Com o fim da Segunda Guerra mundial, EUA e URSS entram em uma disputa que é conhecida como a Guerra Fria. Nessa disputa pela hegemonia política, econômica e militar, essas duas potências travaram uma disputa muito grande no que se refere aos avanços espaciais. Ambos corriam para tentar atingir objetivos significativos nesta área. Isso ocorria, pois havia uma grande disputa entre as potências, com o objetivo de mostrar para o mundo qual era o sistema mais avançado.


No ano de 1957, a URSS lança o foguete Sputnik com um cão dentro, o primeiro ser vivo a ir para o espaço. Depois do sucesso dos primeiros voos com cosmonautas homens, o desenhista soviético de aparelhos espaciais Serguei Korolev teve a ideia de enviar uma mulher ao espaço. Assim, em 1962 começou a busca das pretendentes que deviam reunir os seguintes requisitos: ter experiência em saltos com para-quedas, ser menores de 30 anos, medir menos de 1.70cm e pesar menos de 70 kilogramas.


O processo todo foi iniciado de forma totalmente secreta, reunindo cinco mil candidatas para a viagem a bordo da nave Vostok VI. Ao final, apenas cinco haviam sido aceitas como cosmonautas: duas engenheiras, uma professora e uma tipógrafa além de Valentina Tereshkova. Durante sete meses essas candidatas passaram por um longo treinamento para a seleção final. As finalistas foram Valentina Ponomaryova, uma engenheira e Valentina Tereshkova, uma vez que a ideia inicial era enviar duas mulheres ao espaço, o que não acabou acontecendo. Como decidir entre as duas Valentinas? O presidente da União Soviética e líder máximo do Partido Comunista do país na época, Nikita Krushev foi o responsável pelo desempate. Apesar de Ponomaryova ter se saído bem em inúmeros testes físicos, contou pontos para Tereshkova a sua atuação como líder da União da Juventude Comunista da URSS, a sua experiência com paraquedismo e em parte porque seu pai, Vladimir Tereshkove, era um herói de guerra – ele morreu na Guerra do Inverno finlandês durante a Segunda Guerra Mundial.


Mais algum tempo de preparação e chegou o tão aguardado dia. No dia 16 de junho de 1963, Valentina Tereshkova se tornou a primeira mulher a ir para o espaço, na nave Vostok-6. Durante seus quase três dias de órbita, Valentina foi acometida por náuseas, vômitos, dores na canela direita e desconforto psicológico.


Contudo, em um único voo ela registrou mais tempo de voo do que os tempos combinados de todos os astronautas americanos que haviam voado até essa data. E Valentina também manteve um registro de voo e levou fotografias do horizonte, que foram mais tarde utilizados para identificar as camadas aerossol dentro da atmosfera.


Dever cumprido, era tempo de voltar para casa. Mas mal sabia Tereshkova que os desafios dessa viagem ainda não tinham acabado. Houve um erro na programação da nave que ao invés de um comando de aterrissagem foi introduzido um comando de subida de órbita. Porem Valentina notou essa falha a tempo de corrigir esses erros para que pudesse aterrissar.


Na descida, sua nave perdeu comunicação via rádio com o solo e, ao ejetar após entrar na atmosfera terrestre, esteve próxima de cair em um lago. A cosmonauta temeu por sua vida, uma vez que se caísse no lago não estaria em condições físicas de nadar até a borda e provavelmente morreria afogada. Mas ventos fortuitos mudaram a trajetória do paraquedas e ela pode aterrissar em terra firme, tendo apenas algumas escoriações no rosto devido ao choque do impacto.


Depois disso Valentina Tereshkova recebeu as duas principais condecorações da URSS, a Herói da União Soviética e a Ordem de Lênin. Mas nos bastidores do voo aconteceu um romance que se consumou em matrimônio cinco meses depois da ida de Valentina ao espaço. No dia 3 de novembro de 1963, Tereshkova se casou com o cosmonauta Andriyán Nikoláev. Após um ano tiveram uma filha, Elena.


Mas a vida de Valentia não se restringiu a vida doméstica. Enquanto sua vida familiar estava em adamento, Tereshkova também perseverou em conquistar uma vida acadêmica. Em 3 de novembro de 1969 formou-se em engenharia pela Academia Militar da Força Aérea da Zhukovsky e saiu do programa espacial a fim de entrar na vida política do país euroasiático. Nessa ocasião, ela recebeu uma comissão honorária da Força Aérea Russa e se aposentou como major-general.


E no interim da sua vida acadêmica e profissional, Tereshkova presenciou a dissolvição da URSS – 1966/1991. Durante esse processo Valentina teve grande destaque na vida pública soviética, tornando-se presidente do comitê de mulheres soviética e membro do Soviete Supremo, o parlamento do país socialista. Além de reconhecidos cargos políticos na União Soviética, Tereshkova também se tornou uma representante conhecida da sua pátria no exterior.


Com o fim da União Soviética, Valentina Tereshkova mesmo perdendo seu escritório político não perdeu seu prestígio. Ainda hoje ela é reverenciada como uma heroína e sua importância na história espacial russa junto a Yuri Gagarin e Alexey Leonov. Em 2011, Valentina foi eleita para a Duma do Estado, a câmara baixa da legislatura russo. Apesar do grande impacto do seu voo, com o reconhecimento quase universal que se seguiu, foi se perdendo ao longo dos anos, mas não para a nação russa e seus contemporâneos.


Em entrevista ao The Guardian, aos 80 anos, Valentina conta sobre a vista da Terra do espaço “um planeta ao mesmo tempo tão lindo e tão frágil, que todos os que a viram dizem a mesma coisa, quão incrivelmente linda é a Terra e quanto é importante cuidar dela. Nosso planeta sofre com as atividades humanas, do fogo, da guerra, nós precisamos perseverar.”


Imagens: Reprodução.

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