Acostumados a criar protagonistas de importantes tramas, inspirações para os leitores, no entanto, não conseguem consagrar-se personagens da própria narrativa histórica latino-americana. Esse é o triste legado de autores literários que “curiosamente” enquadram-se em algum desses grupos: esquerdistas, negr@s, mulheres, feministas, militantes de qualquer outra causa e/ou latino-american@. Isso em um mercado repleto de espaço para os clássicos norte-americanos ou britânicos.
A década de 60 ainda tem ares, na história, de Woodstock e no Brasil, de Tropicalia. Quando fala-se de boom nesse período, conseguimos associar talvez à juventude da era disco, nascidos do fenômeno de explosão populacional classificada como baby boom. Outro tipo de aumento expressivo ocorria e ganhava destaque, porém, sem que muitos lhe dessem devida atenção. O boom literário em nosso continente.
Cem anos de solidão, obra cujo autor, Gabriel Garcia Márquez ganhou Prêmio Nobel por produzi-la, possivelmente foi uma das poucas sobreviventes sessentistas aos ventos do esquecimento. Hoje celebrada em seu cinquentenário por meio de leituras coletivas e eventos especiais comemorativos, desfruta do que algumas contemporâneas e antecedentes não possuem.
Solidão mesmo é aquela que enfrentam as obras de Gabriela Mistral, Miguel Ángel Asturias, Octavio Paz, Mario Vargas Llosa os quais em comum carregam toda a honra concedida pelo Prêmio Nobel e, mesmo assim, festejam (sem o clima de festa) 30, 40, 50 anos em prateleiras de bibliotecas ocasionalmente lidos por um ou outro passante que não baseie-se em recomendações para escolha de leitura.
E quando esse leitor por ventura decide embarcar nessa “nau” que luta contra os mares do tempo, desanima-se com as condições da “embarcação”. Infelizmente encontra edições desatualizadas com ortografias anteriores aos acordos ortográficos (quando em publicações do nosso país) ou sem traduções (no caso de só haver edições em espanhol). Em consequência, volta para as prateleiras de bibliotecas ou sebos, como uma criança que no orfanato não atende aos famosos padrões de procura dos possíveis pais.
Quer entender o porquê? Façamos aqui um exercício. Esqueça-se do nome de todos os livros que lhe obrigaram a ler para alguma instituição de ensino ou vestibular. Não vale pensar em livros que você conheceu graças a filmes ou minisséries. Agora mentalize pelo menos três títulos lidos por você, integrantes da nossa literatura nacional. Vê do que fala-se? Se conseguiu, parabéns! Você é uma espécie rara de leitor, o devorador de livros, amante não apenas da ficção,mas idem dos livros de boa qualidade independente da origem. Se não, isso não é motivo para sofrimento, as estatísticas te saúdam, o desconhecimento é geral, amplo e irrestrito.
Precursores
Tudo o que irá ser dito pode soar como novidade, mas jamais nos foi escondido. É importante relembrar que silenciar, ou seja, não divulgar, é sinônimo de apagar. Você pode, por exemplo não saber que um desse ganhadores de Nobel citados anteriormente disputou a presidência do Perú em 1990 e perdeu. Caso de Vargas Llosa, derrotado nas eleições por Alberto Fujimori. Fator o qual diz muito sobre os limites da popularidade do autor.
A matriarca do feminismo nas Américas, Sóror Juana, também nunca foi muito popular com seus escritos, principalmente entre os membros da igreja. A “Fênix Mexicana” como era conhecida, foi uma freira defensora do direito das mulheres, familiar com enfrentamentos por intermédio de textos aos setores mais conservadores do clero.
O primeiro romance abolicionista brasileiro mostra igualmente o brilhantismo das mulheres tão subestimadas desde aqueles dias. Maria Firmina dos Reis trata em “Úrsula” a condição do escravo no século XIX, tentando aproximar-se do ponto de vista da população negra. Situação semelhante à ocorrida no Perú, quando Clorinda Matto de Turner escreve “Aves sin ninho” dando origem ao movimento indigenista literário.
Engana-se quem pensa que essas escritoras construíam suas obras baseadas em relatos, sob o aconchego da vida doméstica, a qual aliás não era nada aconchegante em uma sociedade patriarcal e machista. Experiência de campo foi o que não faltou a Pagu, militante do partido comunista, primeira mulher presa no Brasil por motivos políticos e a provar que questões de classe deviam e podiam ser discutidas, iniciando os romances proletários.
O realismo mágico do qual Gabriel Garcia Márquez tanto utilizou-se foi mais umas das criações femininas. Em “Memórias del porvenir” Elena Garro dá origem quatro anos antes ao estilo literário tão utilizado para combate às ditaduras latino-americanas. O estrelato merecido por Garro foi ofuscado pelo destaque dado a seu marido Octavio Paz, ganhador do Prêmio Nobel em 1990.
Mistral: amor pela educação e pelas palavras
“Somos culpados de muitos erros e muitas falhas, mas nosso pior crime é abandonar as crianças,desprezando a fonte da vida.” Gabriela Mistral, nascida Lucila Godoy Alcayaga, começa dessa forma um de seus poemas, deixando bem clara a crença de que as crianças inseridas em um sistema educacional bem preparado eram o primeiro capítulo de uma obra digna de premiação, o futuro da nação.
Ela acreditava que a conservação do idioma era fundamental para manter a liberdade de um país, mesmo sem soberania nacional diante dos mandos e desmandos de outras nações. E a língua falada só sobreviveria, é claro, por meio do amor e aplicação dos novos falantes, as crianças. A confiança em futuro conduzindo por esses jovens bem instruídos era tão grande que deixou em testamento grande parte de seu patrimônio conquistado com anos de produção literária iria para aqueles responsáveis por ditar os próximos.
Mistral deu origem a uma série de reformas no ensino mexicano a convite do próprio Ministério da Educação. A educadora e escritora trazia nos seus métodos de ensino formas de aprender sem monotonia. Prova de que carregava toda a poesia e fantasia dos escritos da bagagem literária para o ambiente acadêmico, no qual palavras como aluno (aquele que necessita de luz, segundo tradução literal do latim) permanecem sendo usadas e trazem consigo certa negatividade.
O amor por aprender, segundo a autora, despertava com pequenos gestos como por exemplo a motivação dos professores, a alegria no exercício da profissão. Importante também, era o educador não se limitar aos ambientes escolares. Para romper o tédio e o modelo tradicional necessitava-se que o aprendiz fosse levado para além das fronteiras da sala de aula, aprendendo com experiências próprias ao vivo e em cores. Proporcionar aulas ao ar livre, a museus, bibliotecas e outros espaços sociais e culturais foram algumas das contribuições de Gabriela Mistral.
E como o ensino não é feito só de recompensas e passeios, precisa-se falar sobre punições. Mistral defendeu a atitude não mesquinha por parte dos professores de forma a evitar deprimir ou envenenar a alma da criança. Toda crítica para ela deveria ser elaborada de forma a fazer crescer e não desanimar. No “Decálogo do Mestre” proposto pela autora, que seriam os 10 mandamentos do educador, ela faz questão de relembrar o ofício não apenas como ganha-pão, mas algo em que o profissional empenha paixão e esperança. “LEMBRA-TE de que o teu ofício não é mercadoria senão ofício sagrado.”
Em 10 de Dezembro de 1945 instituiu um título que até hoje pertence somente a ela, única (e primeira) mulher latino-americana a receber um Prêmio Nobel. Recebeu o prêmio das mãos do rei George V, da Suécia e foi chamada merecidamente de “rainha da literatura latino-americana”.
Depois de sua morte, por coincidência dia 10, em janeiro de 1957, permanece como memória de um passado que ajuda a compreender o presente e o direciona para o futuro do Chile. Foi retratada em filmes e documentários de emissoras chilenas e na foto de 5 mil pesos. Além disso, o nome dela batiza ainda um trem, uma serra de sua cidade natal, Montegrande, praças e ruas de cidades chilenas e um centro cultural no coração de Santiago, Chile. Temos ainda conosco, pedacinhos da autora representados pelas obras mais conhecidas de Mistral como Desolación, Ternura, Nubes blancas, Los sonetos de la muerte e Lagar.
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Imagens: Pinteres e PGL