Apenas um Rapaz Latino-Americano
- Izabella Pavetits
- 9 de mai. de 2017
- 3 min de leitura
Um rapaz latino-americano vindo do interior nos deixou este mês. Vamos falar um pouco sobre o cantor Belchior?

Antônio Carlos Gomes Belchior Fontenelle Fernandes, ou simplesmente Belchior, foi um famoso cantor e compositor brasileiro. Considerado um dos compositores mais emblemáticos dos anos 1970, faleceu por causas naturais na madrugada do último domingo, dia 30 de abril. O cearense de coração selvagem foi uma figura marcante na história da música nacional. Segundo o cantor Fagner “Belchior deixa uma obra significativa retratando a nossa história. Tenho certeza que todos vão lamentar essa perda”.
Belchior foi protagonista de uma história de amor à música e às suas raízes da América Latina. Contudo, desaparecimentos e polêmicas marcaram os últimos anos de vida do cantor e compositor. Belchior era o 13º filho de uma família que chegaria aos 23. Antes de ouvir o chamado da música, tentou trilhar seu futuro por caminhos tradicionais. Então, ainda jovem, passou pelas faculdades de filosofia e medicina. Porém, Belchior acabou se unindo a um grupo de conterrâneos que queriam seguir carreira musical. Em 1972, foi descoberto por Elis Regina ao lançar a canção “Mucuripe”.
Mais tarde, a gravação de Elis para as músicas “Como Nossos Pais” e “Velha Roupa Colorida” impulsionou ainda mais a carreira do cantor. Ambas as canções estão no álbum “Alucinação”. Falando em álbuns, Belchior lançou 16 discos durante sua carreira, sendo o primeiro lançado em 1974 e o último e 1999. Seu segundo álbum, “Alucinação”, é comumente declarado como o mais célebre da carreira. Lançado em 1976, o disco é considerado por vários críticos musicais como o mais revolucionário da história da MPB. Um dos mais importantes de todos os tempos para a música brasileira.

Com sua voz “afanhada” e jeito caipira, Belchior foi um ídolo improvável. Certamente, podemos dizer que viveu a divina comédia humana que cantava em suas músicas. O cantor provocava com plena consciência e noção de perigo. E assim se justificava “ninguém pode cantar como convém, sem querer ferir ninguém”. O cearense se colocou em confronto direto com a passividade romântica e com a neutralidade apolítica de outros artistas da época. Chegou a provocar diretamente figuras como Raul Seixas e Caetano Veloso.
Apesar do sucesso de Belchior, a partir de 2007, o cantor se afastou aos poucos da carreira musical, tendo, assim, seus os últimos anos de vida marcados por polêmicas. Por motivos desconhecidos, Belchior resolveu aposentar sua velha roupa colorida e simplesmente sumir. Abandonou carreira, família e bens pessoais. Em 2009, foi dado como desaparecido por família e amigos. O cantor foi encontrado pelo programa Fantástico da Rede Globo e não quis explicar o sumiço. Assim, durante pelo menos 10 anos, o cantor perambulou por cidades gaúchas, onde foi hospedado em casas de amigos e fãs.
A polêmica trouxe Belchior de volta à fama e o número de visualizações de suas músicas no YouTube saltou de 5 para 500 mil. Mas, nem assim o cearense quis saber de voltar aos palcos. Para complicar a situação, Belchior possuía mandados de prisão em seu nome pelo não pagamento de pensões alimentícias, além de dívidas milionárias no Brasil e no Uruguai. O cantor terminou sem residência fixa, sem dinheiro no banco e sem parentes importantes, conforme a famosa letra de “Apenas um Rapaz Latino-Americano”.
Questões pessoais e polêmicas a parte, a contribuição de Belchior para a música popular brasileira é inegável e isso não se pode esquecer. “Não me peça que eu lhe faça uma canção como se deve. Correta, branca, suave, muito limpa, muito leve. Sons, palavras são navalhas. Eu não posso cantar como convém”.
Descanse em paz, Belchior.

Imagens: Livre Opinião, Vermelho Portal e Folha de S. Paulo.