Dia 17 de março de 2017 foi deflagrada pela Polícia Federal a Operação denominada “Carne Fraca”, que teve como foco a venda ilegal de carnes com vencimento alterado por frigoríficos. Cerca de 37 pessoas foram presas durante a primeira ação da força-tarefa policial.
Alguns dos principais frigoríficos do país estão sendo investigados pela Operação Carne Fraca. Estes são: JBS e BRF. O JBS é responsável por marcas como Big Frango e Seara, e o BRF é dono das marcas Perdigão e Sadia.
Além disso, a Justiça Federal do Paraná determinou o bloqueio de 1 bilhão de reais das empresas investigadas. Ao todo, 30 companhias estão sendo averiguadas pela Polícia Federal, incluindo fornecedoras dos grandes frigoríficos.
O atual ministro da justiça do governo Temer, Osmar Serraglio, também está sendo investigado. Pesam sobre ele a sua participação numa conversa grampeada, em que conversa com o suposto líder do esquema criminoso. Contudo, ainda não foram encontrados indícios de atividade criminosa por parte do ministro.
A Operação Carne Fraca tem o objetivo de desarticular a organização criminosa, liderada por fiscais agropecuários do Ministério da Agricultura.
Os fiscais recebiam propina e facilitavam a produção de produtos adulterados ao emitir certificados sanitários sem fiscalização.
De acordo com a investigação, foi descoberto até o uso de carnes podres, maquiadas com ácido ascórbico, por alguns frigoríficos. Também foi encontrado a re-embalagem de produtos vencidos e a presença de papelão na produção de embutidos.
Apesar disso, no dia 21 de março a Polícia Federal publicou uma nota, assinada em conjunto com o Ministério da Agricultura, em que afirma que “as irregularidades apuradas pela Operação Carne Fraca são pontuais e não representam um mau funcionamento generalizado do sistema de integridade sanitária brasileiro”.
Dentre os presos pela organização constavam executivos e funcionários de alto escalão das empresas citadas.
Segundo a investigação, os frigoríficos exerciam influência
direta no Ministério da Agricultura para escolher os servidores que iriam fiscalizar as empresas. Essa relação acontecia através do pagamento de propina.
Para a Polícia Federal, o líder da organização criminosa era o fiscal Daniel Gonçalves Filho, que foi superintendente do escritório do Ministério da Agricultura no Paraná. Ele mantinha parceria com outros servidores do órgão.
Conforme divulgado pela Polícia Federal, a “Carne Fraca” foi a maior operação realizada na história da instituição. Foram mobilizados 1.100 policiais em 6 estados: Paraná, São Paulo, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Goiás, além do Distrito Federal. E o período de investigação foi de aproximadamente 2 anos.
Em resposta à reportagem da Folha de São Paulo, o ministro da agricultura declarou que eventuais falhas são exceções e não refletem todo o trabalho desenvolvido pelas empresas brasileiras durante décadas de pesquisas e investimentos na área.
Durante a Operação foram expedidos um total de 27 mandados judiciais de prisão preventiva, 11 de prisão temporária, 77 de condução coercitiva e 194 de busca e apreensão.
São investigados pela Operação 21 frigoríficos e 33 fiscais do Ministério da Agricultura foram afastados de suas atividades. Há informações de que líderes da organização criminosa se espalham pelas cidades de Londrina, Foz do Iguaçu e Goiânia.
As investigações começaram após a denúncia de um fiscal, Daniel Gouvêa Teixeira, no ano de 2015. Ele denunciou à Revista Época que funcionários estavam sendo removidos de suas funções para atender o interesse de empresários.
A Operação teve efeito nos consumidores internos de carne, deixando-os mais cautelosos. No exterior, a Operação resultou na suspensão de exportação de carne brasileira para 14 países e a União Europeia.
Devido ao clima de desconfiança, o governo tem se esforçado para recuperar a credibilidade da carne brasileira. O ministro da agricultura, Blairo Maggi, foi ao Senado dar explicações sobre a fiscalização. Além disso, ele também participou efetivamente de procedimentos de fiscalização em um frigorífico e um supermercado.
A Polícia Federal recebeu críticas sobre a forma da divulgação das primeiras informações da Operação, que levaram a queda das vendas e credibilidade da carne brasileira.
Ademais, foram descobertas irregularidades no Paraná, alunos da rede pública receberam merenda que continha salsicha de peru sem carne, preenchida com proteína de soja, fécula de mandioca e carne de frango, o caso deu início a uma investigação de 2 anos.
De acordo com o delegado da Polícia Federal, Maurício Moscardi Grillo, “inúmeras crianças de escolas públicas estaduais estão sendo alimentadas com merendas compostas por produtos vencidos, estragados e muitas vezes até cancerígenos, para atender o interesse econômico dessa poderosa organização criminosa”.
Além da indignação moral, o impacto da Operação é grande, pois o Brasil é o maior exportador mundial de carne bovina e de frango, e o 4º maior exportador de carne suína. Em 2016, as exportações brasileiras representaram 7,2% do comércio global do setor.
O esquema criminoso mostrou ter ramificações na política, uma parte dos valores da propina eram revertidos para partidos políticos. O dinheiro beneficiou membros do PMDB e do PP, que não tiveram seus nomes divulgados.
Completando o que as notícias divulgaram sobre a Operação Carne Fraca, é preciso refletir sobre o nível de sofisticação e intimidade com que as atividades ilícitas ocorreram. Segundo informações, um dos executivos chegou a ter acesso a senha do sistema interno do Ministério da Agricultura.
Isso demonstra que o Sistema, além de ser burlado, foi ridicularizado pelos corruptos e corruptores, levando os brasileiros a refletirem se vale a pena continuar acreditando em um Sistema que mostra falhas e crimes em toda sua estrutura.
Para além do caso da Operação Carne Fraca, há algum âmbito em que haja total confiança na burocracia, supostamente implantada para ajudar os cidadãos?
"Carne fraca" remete ao dito popular que fala da fraqueza moral do ser humano ao ceder a tentações. A escolha do nome dessa Operação não poderia ser melhor, uma vez que nos deparamos com uma situação em que os que deveriam proteger o consumidor e garantir escolhas adequadas são os primeiros que decidem “ceder” à tentação de lucrar em cima do bem-estar da população.
Não apenas a uma falha ética, essas notícias levam à indagação sobre o estilo de vida que o brasileiro médio leva.
O sistema de produção de carne se mostrou falho, ainda que pontualmente, e sobretudo a confiança do consumidor foi quebrada. Mas será que a falha não é nossa escolha por um alimento que causa enorme impacto ambiental para ser produzido?
A indústria da carne é responsável pelo consumo exorbitante de água, terra e ração. Muitos locais de reserva são invadidos pelo agronegócio ao não respeitar os limites impostos.
Há também o fato da produção de carne gerar impacto com a liberação de gases que agravam o aquecimento global.
Contudo, no sistema econômico em que estamos inseridos a existência da indústria da carne deriva da demanda por esse produto. É simples, se pararmos de consumir carne, a indústria não terá meios de existir.
O que nos leva de volta às escolhas: do mesmo modo que os fiscais escolherem se corromper, nós podemos escolher deixar de contribuir com essa indústria falha e nociva.
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