Maior nome do folk em todo mundo, o músico Bob Dylan foi premiado esse mês com o Prêmio Nobel de Literatura. Segundo a Academia Sueca que realiza a premiação, o cantor foi escolhido por criar novas expressões poéticas dentro da grande tradição da canção americana. As canções de Dylan, como "Blowin' In The Wind", "The Times They Are A-Changin'" e "Like a Rolling Stone" capturaram o espírito rebelde e anti-guerra dos anos 60 e comoveram jovens de diversas gerações. Bob Dylan é o primeiro compositor a ser reconhecido com o prêmio em toda a história do Nobel. Segundo Sara Danius, secretária da academia, o álbum Blonde On Blonde, lançado em 1966, é um extraordinário exemplo da sua forma de rimas, refrões, e do seu jeito brilhante de pensar.
A seleção do Nobel despertou uma polêmica ao escolher Dylan, e muitas pessoas questionaram se seu trabalho se qualifica como literatura. Outros criticam o fato de que a academia perdeu a oportunidade de chamar a atenção para artistas menos conhecidos. Neto de imigrantes judeus da Rússia, o músico nasceu no ano de 1941 em Minnesota, nos Estados Unidos, e já lançou 37 discos de estúdio e onze ao vivo em seus mais de 50 anos de carreira.
Desde 1988 até hoje, com 75 anos de idade, Bob Dylan faz cerca de cem shows por ano. Segundo familiares, essa é uma opção pessoal do compositor, que não tem motivação econômica. Uma curiosidade pouco conhecida sobre o cantor é que seu nome de batismo é, na verdade, Robert Allen Zimmerman. Além disso, antes de ficar mundialmente conhecido, o músico usou outros nomes artísticos, como Elston Gunn. Acredita-se que o nome Bob Dylan foi inspirado no escritor galês Dylan Thomas, mas o fato nunca foi confirmado pelo próprio artista.
Apesar de não ser o motivo da premiação, Dylan já publicou dois livros, com os títulos de "tarântula" e "crônicas". O primeiro é um exercício delirante de prosa poética, que circulou em edições underground em 1966. O segundo é um volume de memórias em que ele escreve sobre alguns episódios de sua vida, publicado em 2004, esse seria o primeiro volume de três produções, mas até agora os outros não foram publicados.
Com o Nobel, o compositor receberá oito milhões de coroas suecas, cerca de três milhões de reais. O prêmio é concedido pela produção de uma vida, em vez de obras específicas. Esse foi o segundo ano seguido em que a academia surpreende as expectativas, quando escolheu no ano passado a bielorrussa Svetlana Aleksiévitch, uma jornalista, até então, era raro que a academia concedesse o prêmio a autores de não ficção.
Desde o dia em que a premiação ocorreu, até a última quinta-feira, o compositor preferiu adotar o silêncio. Na noite do dia 13 de outubro, dia em que foi anunciado o prêmio de literatura, Dylan fez um concerto em Las Vegas, no qual não fez nenhum comentário sobre o Nobel a seus fãs. De acordo com um representante do músico à Associated Press, a resposta de dylan após o anúncio da academia sueca foi, "sem comentários neste momento", Per Wastberg, membro da academia, disse que o silêncio de Dylan foi mal-educado e arrogante.
Ontem, após duas semanas do anúncio, o compositor falou pela primeira vez ao público sobre o Nobel. Em entrevista ao Telegraph, Dylan disse que, caso seja possível, estará presente na cerimônia de premiação em dezembro, na cidade de Estocolmo. O músico afirmou que a notícia sobre o prêmio Nobel o deixou sem palavras, e agradeceu a homenagem.
Independentemente de sua presença, Bob Dylan será listado como o vencedor, mas o dinheiro pelo prêmio é outro assunto. Como condição, Dylan deve dar uma palestra sobre um tema relevante para a obra para a qual o prêmio foi concedido, até seis meses após a cerimônia de premiação. Ao longo dos anos, outras pessoas já se recusaram a receber o prêmio. Um deles foi o filósofo existencialista francês Jean-Paul Sartre, em 1964. Alguns anos depois, quando Sartre passou por dificuldades, seu advogado escreveu à fundação Nobel pedindo que enviassem o dinheiro ao filósofo, mas o pedido foi negado.
Enquanto isso, personalidades ao redor do mundo veem com satisfação o novo premiado. Ao Guardian, o escritor Salman Rushdie disse que vivemos uma época com ótimos letristas e compositores, mas Dylan destaca-se sobre eles. Sobre a escolha de um nome da música para o Nobel de literatura, Rushdie afirmou que as fronteiras da literatura seguem se ampliando, e considera emocionante o fato de o Nobel reconhecer isso.
Ao ser questionado se concorda com a afirmação da academia sueca de que suas canções estão no patamar da alta literatura, o compositor diz, com hesitação, que acha que sim, pois algumas de suas composições têm um valor homérico, usando como referência o poeta grego Homero, citado pela academia ao justificar a premiação.
No final de 1965, a popularidade de Dylan era quase maior como compositor do que como intérprete. Em apenas duas semanas, foram lançados 80 discos single com versões de músicas assinadas por ele. O nome de Dylan costumava aparecer como possível vencedor do Nobel nas casas de apostas ao longo dos anos, mas na maioria da vezes era olhado com ceticismo, já que seu trabalho não se encaixa nas formas canônicas da poesia, do conto ou do romance, que a academia costuma premiar.
A premiação coloca o compositor americano numa posição curiosa: ele se tornou o único artista na história a ter os principais prêmios nas categorias de música, cinema e literatura. Os grammys são comuns na carreira de Dylan, que recebeu o primeiro em 1973 e já coleciona 12 ao longo de sua carreira.
No campo cinematográfico, Dylan tem um Oscar e um Globo de Ouro, ambos os foram recebidos em 2001, pela canção "Things Have Changed", da trilha sonora de "Garotos Incríveis". O músico recebeu ainda o Pulitzer em 2008, por seu profundo impacto na música popular e na cultura americana, marcado por composições líricas de força poética extraordinária, além do prêmio espanhol Príncipe das Astúrias.
Com o Nobel de Bob Dylan, já são 27 escritores de língua inglesa premiados. A segunda posição é da língua francesa, seguida por autores alemães e literatos de língua espanhola. Em toda a história do prêmio, apenas um autor de língua portuguesa foi premiado: o escritor José Saramago, no ano de 1998. A música Hurricane, lançada em 1976 no álbum Desire, é uma canção de protesto de Bob Dylan contra a prisão do boxeador Rubin "Hurricane" Carter, que foi preso injustamente por assassinato, em 1966. A canção tornou o caso de Carter público e foi considerada fundamental na conquista de apoio popular a favor de sua defesa. Nos versos, o cantor denuncia o racismo da polícia e da sociedade americana que resultaram na prisão de Carter, um tema que continua válido, mesmo 40 anos depois.